O Grupo de Trabalho (GT) de Agregações Reprodutivas da FAO – Organização para Alimentação e Agricultura da ONU, teve sua segunda reunião, em Miami, na Flórida, entre os dias 26 e 29 de março. Esta reunião técnica, teve como foco promover trocas de experiências práticas sobre o assunto. Estiveram presentes no encontro vinte especialistas dos países membros da Comissão de Pesca do Atlântico Central Ocidental (WECAFC). Na reunião, o Brasil foi representado pelos pesquisadores Dr. Vinícius Giglio e Dr. Áthila Bertoncini, gerente de educação e comunicação ambiental do Projeto Meros do Brasil. Além do WECAFC, o encontro reuniu instituições como o Conselho Caribenho de Gestão de Pesca (CFMC), Organização do Setor Pesqueiro da América Central (OSPESCA) e do Mecanismo Regional de pesca no Caribe (CRFM).
Este segundo encontro deu sequência ao trabalho iniciado em outubro de 2013 pela 1ª reunião do GT, que forneceu uma visão geral da situação das agregações reprodutivas na região do Caribe e Atlântico e discutiu as opções de manejo sustentável direcionado às espécies. Seu primeiro relatório e recomendações foram usados no processo de revisão da proteção da garoupa de Nassau sob a Lei de Espécies Ameaçadas dos EUA (ESA), bem como o Protocolo relativo a Áreas e Vida Selvagem Especialmente Protegidas (Protocolo SPAW).
“Essa reunião tem um foco muito forte na garoupa de Nassau (Epinephelus striatus), que é uma espécie presente em todo o Caribe. Não temos esta espécie no Brasil, mas temos o mero (Epinephelus itajara), que está também em algumas ilhas do Caribe e, principalmente, no sul da Florida. E é através do expertise nas pesquisas com meros, garoupas e outros peixes, como os vermelhos, que formam esse conjunto de espécies que agregam para se reproduzir que se dá a nossa contribuição nesse encontro. Buscamos produzir conhecimento para poder propor medidas de manejo e principalmente de proteção dos locais de agregação nas épocas do ano em que estão ocorrendo”, explica Áthila Bertoncini.
Os principais objetivos desta 2ª reunião do Grupo de Trabalho foram:
• Coletar e compartilhar atualizações de status sobre as agregações reprodutivas, assim como o gerenciamento atual da pesca e os regulamentos relacionados à pesca, conservação e comércio;
• Coletar e compartilhar atualizações de status relacionadas à pesquisa científica em andamento, bem como campanhas de divulgação e educação;
• Analisar e discutir o progresso da implementação e os desafios relativos às recomendações de gestão adotadas na primeira reunião do Grupo de Trabalho;
• Identificar e acordar maneiras de melhorar a implementação das recomendações atuais de gerenciamento;
• Discutir e acordar maneiras de harmonizar e implementar medidas de gestão regional para conservar a garoupa de Nassau;
Durante a reunião, os pesquisadores brasileiros apresentaram as regras e regulamentações da pesca no Brasil, com foco nas espécies que formam agregações reprodutivas, e falaram sobre os desafios da gestão pesqueira no Brasil com seus cerca de 8.500 quilômetros de litoral, distribuidos nos 17 estados costeiros, como explica Áthila: “O Brasil tem boas ferramentas de regulamentação esferas, Nacional e Regional, no entanto, tem sérios problemas na implementação desses instrumentos, que muitas vezes acabam ficando apenas no papel. Ao compartilhar a experiencia do Brasil, relatei um pouco do jogo de forças entre o Ministério do Meio Ambiente e o extinto Ministério da Pesca quando tange a exploração comercial de uma espécie. Um dos nosso grandes problemas hoje é que desde 2008 não há nenhum plano de monitoramento nacional da produção de pescado. Essa falta de continuidade enfraqueceu todas as Políticas Públicas na ultima década. Há a Lei da pesca, que foi aprovada em 2009, que trouxe vários avanços, mas também uma fragilidade muito grande quando trata das obrigações atribuídas ao Estado. Por exemplo, importantes medidas de gestão, como o monitoramento, são apenas sugeridas como atribuições do Governo, mas não há obrigatoriedade explícita legalmente. Essas são grandes diferenças para promover uma gestão eficiente. Além disso, há o enfraquecimento dos Comitês Permanentes de Gestão, que são os espaços em que ocorrem as discussões entre o Governo e a Sociedade por meio dos fóruns. Desde a criação da lei da pesca, eles estão suspensos. Resumidamente faando, no Brasil não sabemos o que estamos pescando, onde estamos pescando e em que quantidade. Essa é uma informação que o governo não está disponibilizando para a sociedade”.
Com esse cenário posto, Áthila explica porque a criação da polêmica Portaria 445, no final de 2014, pode ter sido equivocada: “Os cientistas se reuniram ao longo de vários anos para criar a lista nacional oficial da fauna marinha ameaçada. E aconteceu justamente o que os cientistas estavam temendo. A idéia era que se criasse, a partir desta lista, um diálogo com a sociedade para discutir como seria feito o manejo das espécies ameaçadas. Só que o gverno brasileiro, na época, se precipitous e lançou esta portaria simplesmente proibindo a captura de todas elas nos 180 dias subsequentes. E aí foi aquele jogo de empurra de aprovar e derrubar a Portaria e quem perde é o setor produtivo pesqueiro, o meio científico com o sério comprometimento dos próprios recursos pesqueiros. Então, entre idas e vindas, tiveram duas portarias no final do ano passado, que acabaram liberando 47 dessas espécies para serem pescadas até 2018. São espécies que estão categorizadas como vulneráveis”.
Vale lembrar que o mero não está dentro destas portarias, já que existe uma normativa específica para a espécie.
Para finalizar, Áthila Bertoncini falou de algumas ações recentes, como a questão das criação de grandes Áreas Marinhas Protegidas: “Apesar do esforço dos cientistas em apoiar, houve um conflito muito grande de interesses que ao final das negociações redesenhou a proposta das Unidades de Conservação de Proteção Integral retirando as ilhas, que são justamente as áreas mais sensíveis e que devem ser protegidas. Pelo menos, há um lado positivo, que é o fato de já termos alguns Planos de Ação Nacional (Pan), como o Pan dos manguezais, o de tubarões e raias e o de ambientes coralíneos, liderado pelo Projeto Coral Vivo e no qual o mero está inserido, já que é uma da espécies que está coberta dentro deste Pan”.
O Projeto Meros do Brasil é realizado pelo Instituto Meros do Brasil em parceria com nove instituições de ensino e pesquisa comprometidas com a conservação marinha ao longo da costa brasileira. O Projeto Meros do Brasil conta com o patrocínio Petrobras através do Programa Petrobras Socioambiental.